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Presidente da ANIVEC em entrevista à Rádio Vizela


Notícia Rádio Vizela


Têxtil e vestuário ressentem-se da crise conjuntural

As exportações do setor da indústria portuguesa do têxtil e do vestuário sofrem queda após um 2022 com resultados positivos. A retração no consumo nos países de destino é fruto de uma crise conjuntural que afeta a Europa e que acaba por resultar na redução de encomendas. Os momentos são de “aflição”, diz o vizelense César Araújo. O presidente da Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e Confeção (ANIVEC) lamenta que o Orçamento de Estado 2024 não contemple política económica e teme que o programa “Qualifica Indústria” venha a constituir uma oportunidade perdida.

Em finais de outubro, líamos, no “Dinheiro Vivo”, que os dados referentes aos primeiros oito meses de 2023, mostravam que “as exportações da fileira do têxtil e do vestuário caíram 5,56% face ao período homólogo”. “Depois de um crescimento recorde, a dois dígitos, em 2022, com as exportações a atingirem a marca histórica dos 6122 milhões de euros, a indústria têxtil e do vestuário estima fechar este ano com uma quebra nas vendas ao exterior de 5% a 7%, o que corresponde a perdas de 300 a 400 milhões de euros face ao ano passado”, acrescenta o jornal que se debruça sobre a atividade económica portuguesa.

Os números refletem uma redução no número de encomendas, o que é sempre motivo para preocupação, refere César Araújo, ao RVJornal. “Temos um problema conjuntural. Uma guerra na Ucrânia, agora uma outra no Médio Oriente, a Europa está mergulhada numa crise inflacionista, que faz aumentar o custo de vida das populações, às quais está a ser imputada uma carga fiscal brutal”, descreve o presidente da ANIVEC, ao mesmo tempo que aponta o dedo ao Orçamento de Estado apresentado pelo Executivo do primeiro-ministro António Costa e aprovado na semana anterior, na generalidade, pela maioria socialista da Assembleia da República. César Araújo defende que, além de ser um Orçamento sem economia e sem atender às necessidades das empresas, é um documento que “penaliza as pessoas”. Vai mais longe ao fazer a analogia com a Fábula do Burro e da Cenoura: “A cenoura é colocada à frente do burro, que começa a correr sem que nunca consiga alcançá-la. O Orçamento de Estado é isso mesmo”.

“Uma crise brutal causada por fatores que não podemos prever, nem muito menos controlar”

Resumindo, a crise é conjuntural, de dimensão mundial, “com um peso enorme na Europa, originando uma retração brutal no consumo”. As consequências para o setor do têxtil e do vestuário parecem ser inevitáveis. “E não é porque as nossas empresas ou os nossos empresários não sejam bons. Estamos é perante uma crise brutal causada por fatores que não podemos prever, nem muito menos controlar”, assegura o responsável. Daí que o momento que se vive em muitas empresas do setor, nomeadamente das que se encontram sedeadas na nossa região é, de acordo com César Araújo, de “muita aflição e preocupação”. Os desafios têm sido em catadupa. Desde a pandemia à guerra na Ucrânia, passando pela crise energética, pelo aumento da inflação até à subida das taxas de juro. Como se já não bastasse, eis que no último mês se dá o agravamento da situação no Médio Oriente, entre Israel e o Hamas e que pode colocar nova carga negativa na atividade económica. “Se aumentarem os combustíveis, isso terá um impacto enorme nas contas das empresas”, lembra o presidente da ANIVEC.

Já houve encerramentos e há empresas que adiantaram férias dos seus trabalhadores por falta de trabalho. Escreveu ainda o “Dinheiro Vivo” que o levantamento feito, antes do verão, indicava que 700 a 1000 pessoas já teriam perdido o seu posto de trabalho. César Araújo sabe que existem empresas paradas e outras em risco de colapsarem mas alerta para o facto da crise não ser exclusiva do setor do têxtil e do vestuário, que emprega cerca de 130 mil pessoas no país, mas antes transversal a muitos outros setores da economia portuguesa. “O que espero é que não haja maior retração do consumo a nível mundial”, diz. Segundo o Informa D&B, o número de insolvências nas indústrias do têxtil e da moda (inclui os dados do calçado) quase que duplicaram, até ao último mês de setembro, passando de 82 em 2022 para 260 em 2023.

Programa Qualifica Indústria? “Não está a funcionar com ninguém”

Em simultâneo, eis que se impõe o desafio da transição para uma economia mais circular e mais sustentável. Não só para dar resposta às exigências dos consumidores mas também para dar cumprimento à visão estratégica da Comissão Europeia. Sustentabilidade não tem de ser sinónimo de redução na produção da indústria do têxtil e do vestuário mas deve implicar processos de desenvolvimento inovadores assentes na inevitável digitalização da indústria. Eis que entra na equação a formação dos recursos humanos. “Tentamos desenhar um programa com o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) para aproveitar esta baixa de produção e formar os quadros das empresas. Temos um grande problema. Aproximadamente 30% da população portuguesa tem apenas o 4º ou o 6º ano, porque se começou a trabalhar muito cedo para ajudar a sustentar a família. Passados 30 ou 40 anos, as necessidades das empresas são agora muito maiores, confrontam-se com as novas tecnologias e a digitalização e precisam de formar os seus quadros. Por isso, demos início a este trabalho mas acabamos por nos deparar com medidas que não servem a ninguém, a não ser ao Governo para fazer bonito sem gastar dinheiro”, atira o dirigente.

Recorde-se que o Governo criou o programa Qualifica Indústria com o intuito de apoiar a requalificação de trabalhadores em risco de desemprego, mas impôs que só poderão ter acesso a ele empresas com quebras de vendas de pelo menos 25% num só trimestre quando comparado com o período homólogo do ano anterior. “É um travão”, diz César Araújo. Mas há outros assegura o presidente da ANIVEC. “O programa não está a funcionar com ninguém”, garante. “Não basta sentar as pessoas para ocuparem as salas do IEFP, nós temos de as ensinar em contexto de trabalho a utilizar as novas ferramentas para termos uma indústria forte, coesa e capaz de competir a nível global”.

Entretanto, no último mês, a baixa produtividade de Portugal face à média da União Europeia voltou a ser notícia. Segundo números do Eurostat, no ranking europeu de produtividade de 2022, Portugal está no fundo da lista. Abaixo só mesmo a Eslováquia e a Grécia. Por outro lado, se olharmos para o nível de qualificações da população portuguesa, verifica-se um crescimento ao longo das últimas décadas. “É verdade que temos uma geração melhor qualificada quando comparada com a dos seus pais. Mas o que temos é de nos igualar à Europa e ao países mais evoluídos do mundo. A formação deve constituir uma oportunidade para todos”, defende César Araújo.

E quando se fala de equidade há outras batalhas a encetar. O presidente da ANIVEC lembra que “mais de 85% da roupa que se vende na Europa tem proveniência de países terceiros que não pagam taxa aduaneira e que, para além disso, não oferecem reciprocidade. A Europa não pode exportar para esses países, porque os produtos são tributados com taxas elevadas. Ou seja, não há esta reciprocidade e a Europa, de forma hipócrita, está a dar de moeda de troca alguns setores, entre eles os tradicionais como o têxtil, o vestuário, o calçado e o mobiliário”.

É possível ver a luz ao fundo do túnel? A tão ansiada retoma? “Acho que a retoma só se poderá dar, falando nos ciclos de estações, nos meses de abril e maio. Isto se não houver mais guerras, instabilidade, mais inflação ou menor poder compra”. Ao mesmo tempo, César Araújo diz que é imperativo Portugal ter mais política económica. “Precisa de criar indústrias com capacidade de competir a nível global e de um Orçamento de Estado que seja amigo das empresas, porque são elas que criam emprego. Temos um Estado Social brutal. Sabemos que dá votos, mas não podemos defender um modelo de subsidiodependência. O que nós precisamos é de um país moderno e inovador, que permita às pessoas que trabalham ter melhor qualidade de vida”.

Alfândega do Porto recebe Cimeira do Vestuário Profissional

Entretanto, está a decorrer na Alfândega do Porto, a cimeira do vestuário profissional, organizada pela ANIVEC em parceria com a PCIAW – Professional Clothing Industry Association Worldwide. Termina esta quinta-feira, dia 09 de novembro, com uma Gala de Atribuição de Prémios. “A ANIVEC conseguiu com que viessem a Portugal 300 compradores, porque a roupa de trabalho pode também ser uma oportunidade para o desenvolvimento do têxtil e do vestuário. A ANIVEC está a fazer grandes iniciativas para poder promover a nossa indústria. Este PCIAW Summit proporciona a partilha de conhecimento com os grandes players a nível mundial e é uma oportunidade de negócio”.

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